Paula Rego pretende desenhar todos os livros de Eça de Queirós, o seu escritor português favorito, disse a pintora portuguesa a propósito de uma exposição em Londres de telas inspiradas no livro “A Relíquia”.
Depois de ter criado uma série de quadros com base em “O Crime do Padre Amaro”, em 1997-98, a artista adiantou à agência “Lusa” estar já a trabalhar com base no romance “O Primo Basílio”.
“Espero desenhar os livros todos do Eça. A minha neta Grace é perfeita para [modelo] Luisinha”, garantiu, nomeando a protagonista loira e de pele branca de “A Relíquia”.
Na exposição “O Último Rei de Portugal”, que estará aberta de 1 a 25 de outubro na galeria Marlborough Fine Art, em Londres, Paula Rego apresenta oito pastéis inspirados pelo livro publicado em 1887.
No texto de introdução do catálogo, o escritor Adam Foulds adverte que “as imagens de Rego estão como de costume longe de serem ilustrações” e que a pintora produz nestas obras “recompilações e interpolações” da narrativa.
“A cena de praia de ‘Dream’ tem uma visão de Cristo crucificado flutuando em frente a um sol gigante. Tem também um Diabo a olhar de forma lasciva e com um falo comicamente grande a espreitar por detrás de uma rocha”, descreve.
Paula Rego diz admirar Eça de Queirós “mais do que qualquer outro escritor português” por causa do humor, sarcasmo e valores sociais, os quais considera atuais.
“Ele descreve os portugueses de uma forma que eu ainda hoje reconheço. Estas histórias inspiram-me”, justificou.
O título da exposição que abre na quarta-feira deriva de uma série de seis pastéis que produziu sobre a vida de Manuel II, com quem admite identificar-se enquanto “exilada”.
Manuel II foi obrigado a sair de Portugal devido à instauração da República e procurou exílio no Reino Unido, onde a mãe, D. Amélia, tinha crescido.
Porém, a pintora, distinguida em 2010 pela rainha Isabel II com o grau de Oficial da Ordem do Império Britânico pela sua contribuição para as artes, vincou: “Não é propriamente uma homenagem. O meu avô era um republicano bem como todos os seus amigos da altura”.
O episódio da fuga de Manuel II da praia da Ericeira num barco a remos, em 1910, bem como a morte por sufocamento devido a uma infeção na garganta, em 1932, são retratados por Paula Rego.
A história contada pela avó da pintora sobre os peitos de D. Amélia, que saltavam para fora do vestido do vestido cada vez que viajava de carruagem por estradas acidentadas, influenciou “Magpie”, tela onde um adulto bem vestido aparenta ser aleitado pela rainha de seios expostos.
A última série da exposição são 13 aguarelas de ilustração do conto tradicional “A Sopa de Pedra”, cuja versão a artista portuguesa disse ter adaptado para trocar de protagonista.
“Eu não gosto de histórias portuguesas com padres, por isso mudei-a para uma história de uma rapariga”, explicou.
A proposta de um editor para publicar os desenhos em livro, que será lançado durante a inauguração da exposição, na terça-feira, criou a necessidade de ter um texto, o qual pediu à filha Caroline Willing para escrever.
“Ela levou os desenhos e criou uma história para encaixar com as imagens. Eu achei que estava engraçada”, contou.
Paula Rego vive em Londres, onde chegou com 17 anos para estudar na Slade School of Fine Art e onde conheceu o futuro marido, o artista inglês Victor Willing, falecido em 1988.
Atualmente com 79 anos, confiou manter uma rotina simples: “Pinto, como, bebo champanhe e depois vou dormir, sozinha”.