Off the record

Venceslau Fernandes: Uma vida dedicada ao ciclismo

Aos 70 anos, mais de três décadas depois de ter deixado a competição, Venceslau Fernandes continua a dedicar-se ao ciclismo. As manhãs são reservadas para a prática da modalidade, rotina da qual não abdica, e as tardes são passadas na loja e oficina de bicicletas, em Perosinho. As bicicletas não têm segredos para “Lau”, como é tratado pelos amigos naquela freguesia de Vila Nova de Gaia, onde nasceu e sempre viveu.

A paixão pelo ciclismo começou muito cedo. “Aos 12 anos comecei a apaixonar-me por bicicletas, embora já fosse adepto do desporto. Quando a Volta a Portugal passava em Gaia o meu pai levava-me sempre a ver os ciclistas a passar e foi a partir daí que me interessei pela modalidade”, revelou à Move Notícias. Por isso, não hesitou em começar a trabalhar para juntar dinheiro e comprar a sua primeira bicicleta, que custou 1.200 escudos: “Na altura isso já era muito dinheiro e os meus pais não tinham possibilidades para a comprar. Depois da escola ia trabalhar para uns agricultores e ajudava o padre nas missas e foi assim que juntei o dinheiro”.

Venceslau Fernandes

A partir daí Venceslau Fernandes teve que enfrentar um caminho de luta até se tornar profissional: “Éramos sete irmãos e tinha que ajudar em casa. Por isso, sempre trabalhei e conciliei o trabalho com o ciclismo”. Começou a participar em provas aos 14 anos, “às vezes não corriam bem, mas nunca desistia”, no percurso de atleta profissional representou vários clubes como o FC Porto, o Benfica ou o Leixões, mas conta que aqueles eram tempos muito diferentes do que se vivem hoje. O percurso profissional foi interrompido quando teve que servir no Ultramar, mas a bicicleta não ficou para trás: “Conseguia ter tempo para andar de bicicleta, mas primeiro cumpria sempre o serviço. Mesmo quando fui para Angola, onde estive dois anos, também levei a bicicleta comigo”.

Quando regressou a Portugal retomou a atividade no ciclismo e diz que a “garra” e a “vontade de vencer” foram os factores que o levaram a construir um nome na modalidade, que culminou com a vitória na Volta a Portugal em 1984, altura em que tinha 39 anos. “Tive momentos muito bonitos no meu percurso, mas de facto essa vitória é que fica para a história”, acrescentou. Oito anos depois, quando tinha 47 anos, deixou a competição. Venceslau Fernandes defende que poderia ter conseguido mais sucesso no desporto, caso tivesse deixado de trabalhar: “Se calhar nunca tive a rentabilidade que poderia ter se me dedicasse exclusivamente ao ciclismo. Mas se o tivesse feito não teria o património que tenho hoje”.

Venceslau Fernandes

A par da loja de bicicletas, o ex-atleta também tem a escola de formação Venceslau Fernandes, mas diz que só vai continuar enquanto o filho, Venceslau, competir, uma vez que está “desiludido”: “Não temos apoios, nem mesmo da câmara. Sem condições não podemos trabalhar”. Por outro lado, diz que ao ciclismo não é dada a importância que se dá a outros desportos “como o futebol ou o atletismo” e que sem isso não se pode formar uma geração de ciclistas, que possa singrar a nível internacional.

Além do filho, Venceslau, também a filha, Vanessa Fernandes, que seguiu o desporto. Vanessa conquistou vários títulos no triatlo, mas um problema de saúde afastou-a da competição. Venceslau Fernandes não esconde a tristeza por ter visto a filha passar por dificuldades: “Trocava todas as alegrias que tive com as vitórias dela, para que a Vanessa não passasse pelo que passou. Mas ela vai voltar em breve e ainda vai conseguir muitas vitórias. Ela ainda é a melhor do mundo”.

Venceslau Fernandes

 

Fotos: José Gageiro