Dantas Rodrigues

Advogado

Marinho Pinto e a política

A imprensa – a nossa – tem ultimamente falado muito a respeito de um luso-deputado europeu que resolveu, de um momento para o outro, não exercer as funções para as quais fora eleito, caso daqui a um ano seja eleito para outras funções. Sem surpresa, graças ao muito que prometeu e que os mais desconfiados, nem que os partidos digam que são da Terra, não acreditaram nem um bocadinho.

Os ares de Lisboa são, sem dúvida, muito mais acolhedores e temperados do que os da Europa do Norte, onde, pelo frio que faz e pela neve que cai, o trabalho se apresenta como a melhor solução para os males da preguiça. Habituados à praia e às esplanadas, talvez seja por isso que os nossos conterrâneos, ou a sua esmagadora maioria, sempre que se lhes fala naquela parte do globo, costumam torcer o nariz e proferir uns quantos sarcasmos.

Na mentalidade setentrional, tudo é, de facto, diferente, logo a começar pelos almoços ditos de trabalho, que apenas duram o tempo necessário para comer e falar dos assuntos que os motivaram, ou pelas reuniões que, bem ao contrário do que é uso entre nós, são feitas (disseram-me) com toda a gente de pé, sem autointerrupções próprias de quem não tem as ideias arrumadas, e escrupulosamente medidas pelo relógio.

O que acaba de ser dito não significa (longe disso!) que por aquelas paragens a perfeição seja coisa terrena, mas, valha a verdade, a vida é bem mais fácil ou, pelo menos, muito mais racional, tudo anda, há desenvolvimento, as instituições funcionam, há riqueza para repartir, etc., etc., o que faz com que todos aqui adorem isso, mas, coisa estranha, muitos se recusem a ver porquê, alguns até com recorde de absentismo no Parlamento Europeu.

É um facto que dá trabalho levar as coisas a sério, sobretudo se se tiver de prestar contas aos eleitores, o que obriga desde logo a uma disciplina de difícil habituação. Não critico. Cada um é como é e nem todos têm estofo, já não digo para fazer sacrifícios, mas, ao menos, para darem um pouco de si próprios a favor do bem comum.

Agora o que crítico, sim, é a falta de honestidade intelectual dos que se escondem atrás de falsos moralismos ditados por ordenados de 17 000 euros mensais para desistirem ou, para ser mais exacto, para desrespeitarem o voto de quem neles confiou e depositou a esperança de que, com a sua coerência e tenacidade, iriam lutar, quais mata-mouros, para que as coisas melhorassem.

Eu não me incluo, felizmente, nesse número de votantes que foi enganado, mas também, em nome da mais elementar consciência cívica, não me posso calar perante a atitude de quem só sabe gesticular e, com a maior das demagogias, dizer que afinal ficou desiludido com o que viu no Parlamento Europeu e que é em Portugal que se dispõe a lutar. Como se isso fosse credível, pronunciado por quem mais jurou pela seriedade de um ex-primeiro-ministro de habilitações académicas duvidosas e se empenhou em desacreditar quem denunciou.

Seria interessante saber o que pensam de nós os que mandam em Portugal. Quem conheça um pouco da mentalidade germânica, facilmente adivinha o que Angela Merkel, Wolfgang Schäuble ou Jean-Claude Junker pensam de um povo que nem sequer conhece os políticos que elege.

Em suma, tudo o que se passou é desprestigiante para todos e só é de esperar, se a memória não for curta, que nas próximas eleições os portugueses se lembrem que quem não foi capaz de os servir na Europa também não será capaz de os servir no seu país, seja como deputado, seja como primeiro-ministro, seja, enfim, como Presidente da República.

Mentir, mesmo em política, não dignifica ninguém e muito menos quem arranja pretextos para esconder a sua falta de aptidão, alegando entre outras demagogias imoralidade salarial para virar as costas a quem o elegeu e que, dentro de poucos meses, talvez se recorde do ditado popular que diz: cesteiro que faz um cesto, faz um cento.

**Por Dantas Rodrigues, sócio-partner da Dantas Rodrigues & Associados