Os Portugueses sabem bem o que é essa palavra chamada regresso. Nómadas pela natureza do sangue e pela dureza da vida, muitas gerações de portugueses experimentaram o que era ir e o que era regressar. E, no meio, deixaram que ficasse essa palavra mística e única no mundo chamada saudade. A saudade pode ser definida como o sentimento que nasce entre o momento de ir e aquele outro de regressar.
Os regressos estão depois muito ligados ao campo das emoções. Ao campo do que a memória guardou para nós. Tal como acontece com a gastronomia. A nossa memória afectiva e olfactiva – ou para ser ainda mais correcto, a nossa memória sensitiva é aquela que nos educa o paladar e nos permite registar as subtilezas de um prato, de um aroma, de um momento único.
Por isso regressar em gastronomia é quase um acto obrigatório! Para que a memória se cumpra ou se renegue. Para que possamos continuar a confiar na nossa natureza.
O Los Ibéricos é de uns amigos que esquecidos da maldade do vento ou do casamento resolveram ser felizes ao abrigo de uma união que aqui é sempre celebrada – do melhor que nos dá a cozinha galega e da mesma excelência que nos é oferecida pela cozinha do Norte de Portugal.
Aliás, na correcta tradução das coisas, se existe um receituário tradicional da região é precisamente o fulgurante receituário Galaico Duriense.
Com o Chef Vítor Correia a liderar com mão segura e criativa a batuta da cozinha, o Los ibéricos é uma excelente alternativa para quem quer provar bons pratos do ilustre receituário gálico duriense, ou, para quem quer simplesmente deleitar-se com as tapas espanholas e petiscos portugueses.
Fui ao “Los Ibéricos” com dois bons Amigos. Um grande escritor mas péssimo garfo (como se pode escrever tão bem nessa depauperada condição?!) e outro grande empreendedor (até da escrita) tão gastrónomo como que eu, mas fatidicamente achacado de males da vesícula, do estômago, ou (suspeito eu…) de outras estéticas que ele não quer confessar.
Estava sozinho, portanto. Mas não me amedrontei. Com uma garrafa de Riso branco cuja colheita de 2014 esgotou no mercado, lá pedi aqueles inolvidáveis ovos rotos, onde uma cama de batata frita, feita na sertã, se deixa envolver por fatias finas de presunto que são o “lençol de baixo” de uns riquíssimos e reluzentes ovos estrelados. Antes de servir, o prato é misturado na mesa, é rompido ou roto como dizem os espanhóis (que a versão portuguesa pode dar declinações menos felizes…).
Que delícia de textura e de paladar! O meu companheiro “vesiculado” da esquerda contorcia-se só de ver a minha voracidade palativa. O meu companheiro asceta da frente bebericava imperturbável um golo de água natural.
Prossegui, claro, com um polvo à galega – cozido no seu ponto, finamente laminado e besuntado daquele colorau – o pimentão vermelho que lhe dá o toque final de um dos ícones principais da cozinha do Norte da Península.
A croqueta recheada, suave na substância rica e aveludada, e segura no polme leve que a envolve, é outra iguaria que a todos recomendo. O presunto “Bellota” ou de “Porco Bísaro”, tanto dá – o queijo de Manchego ou de S. Jorge pouco importa, um pão bonito de centeio, enfim tudo o que esta mesa ibérica nos oferece de inesquecível, habita aqui, com alegria nestes abençoados “Los Ibéricos”.
Os “Los Ibericos” têm também riquíssimos pratos de substância e, todos os dias, apresentam propostas de peixe (pudera, com o Mar ali a fazer-se ouvir) ou de boa carne ibérica. As propostas do dia eram o robalo, bem tratado e fisgado no mar e a famosa posta, julgo que de carne arouquesa pela textura que mostrava.
O Vítor veio também daquela casa imortal que era o Bule (sem o “H”). Onde se comia o melhor pato assado na tábua do Porto. Pois a verdade é que ainda se come aqui no Los Ibéricos, com a mesma boa gordura e pele estaladiça, com o mesmo arroz que é lardeado de pedaços de salpicão, com a mesma jurisprudência afirmada de quem é filho da casa.
No resto, a carta é ampla e sugestiva e não lhe desvendo tudo para que se deixe surpreender por este lugar leceiro onde já fui feliz, onde regressei com gosto, onde matei a Saudade!
LOS IBÉRICOS
Largo do Castelo, 3
4450-631 Leça da Palmeira
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Telef: +351 224 965 049