Dantas Rodrigues

Advogado

Sexo e género

Por Dantas Rodrigues, sócio-partner da Dantas Rodrigues & Associados

Desde março de 2011 cerca de quatrocentos pessoas alteraram o sexo no registo civil através da Lei da Identidade de Género. Para breve teremos a revisão da lei que irá diminuir para 16 a idade mínima para mudar o género legal – de feminino para masculino ou vice-versa -, desde que a pedido dos pais e do menor, e deixa de exigir relatório médico. Simultaneamente poder-se-á mudar o nome e o género nos registos escolares, mesmo antes dos 16 anos.

Muito se lê por aí sobre sexo e género e muito pouco acerto se vê. É natural, já que se trata de uma entre as muitas culture wars que caracterizam os tempos pós-modernos que vivemos, e o que interessa, de acordo com Jean-François Lyotard, são «os novos jogos de linguagem, jogos esses que não reivindicam verdades absolutas, e que antes glorificam um universo de relações entre as pessoas, e entre estas e o mundo, em perpétua mutação.»

É evidente que aquele filósofo e pós-estruturalista francês, quando escreveu Le différend (1983), não estava a pensar nos vinte e um géneros divulgados em 2015 pela Rádio Canadá, de Montréal, mas, à luz do que atualmente se passa, não será certamente descabido presumir que o livro citado muito tem contribuído para o discurso militante LGBT.

Mas teoria e realidade são coisas bem diversas. Por mais que se filosofe sobre a vida e o destino trágico ou cómico dos seus protagonistas, há factos indesmentíveis e incontornáveis. E um desses factos indesmentíveis e incontornáveis é o sexo, com toda a carga polissémica que a palavra contém.

Ninguém ignora que o sexo masculino é diferente do feminino. Julgo, por conseguinte, não carecer de qualquer tipo de demonstração que um homem ou uma mulher, por mais que, conceptualmente, se identifiquem com um daqueles tais vinte e um géneros que a dita Rádio Canadá repertoriou, serão sempre um homem e uma mulher, independentemente das alterações fisiológicas e hormonais que se auto-infligirem. E isto pela simples razão de que é impossível mudar o interior do corpo, os cromossomas, as gónadas e os órgãos genitais internos. Não é preciso ser médico para ver que, pelo menos por ora, assim acontece.

Baixar dos 18 para os 16 anos, mudar o género legal – de feminino para masculino ou vice-versa, com o consentimento dos pais dos interessados, naquelas idades, dificilmente consigo vislumbrar maturidade e experiência suficientes que permitam tomar tão importantes e decisões.

Repito a teoria e realidade não são a mesma coisa. E se no papel, com maior ou menor pressão política, com maior ou menor necessidade de votos, qualquer ministro ou secretário de Estado tudo poderá resolver com uma simples assinatura, o mesmo decerto já não acontecerá com a assinatura genética que nos foi posta ao nascer. O sexo declina-se apenas no masculino ou no feminino, não existindo sexos neutros. Diz-se ele ou ela e é tudo. O neutro não se aplica nem a pessoas nem a animais. E porque as palavras significam intrinsecamente coisas, fora delas a linguagem não se torna possível. É desordem! Ignorar realidade tão elementar é sair do mundo real e entrar no mundo de todos os vícios e de todos os narcisismos, onde tudo se equivale.

O debate em torno do género e do sexo mais não é do que uma culture war que só tem servido para fraturar as sociedades, e branquear a penúria económica em que todos vivemos.