Depois do susto com a saúde que lhe diagnosticou cancro na cabeça, o ator não se deixou abater, voltando à ficção mais depressa do que se julgava “para vender” na próxima novela da SIC “Espelho d’Água”. Aos 52 anos, João Ricardo é o exemplo de que se pode agarrar ao amor para continuar, até porque ainda tem mais sessões de radio e quimioterapia pela frente.
“Os tratamentos vão durar mais oito meses, mas tem sido fácil graças ao meu filho [Rodrigo, de 11 anos de idade], à minha namorada e ao meu amigo Gonçalo Diniz que me apoiaram como nunca durante o processo inicial do tratamento”, conta à margem da apresentação da nova produção de Carnaxide, no Museu Marítimo de Ílhavo.
Foi a 7 de outubro do ano passado que o seu mundo desmoronou quando, depois de um dia de gravações de “Rainha das Flores”, desmaiou. Levado por uma amiga para o Hospital de Santa Maria, em Lisboa, acabou operado de urgência a um tumor na cabeça que, após biópsia, se soube ser maligno.
Entre risos, João Ricardo recua até ao momento em que soube a natureza do cancro: “Houve um médico que esteve ali meia hora para me dizer que tinha um tumor maligno e a única hipótese que tive foi de lhe dizer: E agora o que quer que eu lhe faça?”.
O problema obrigou-o a sair mais cedo da história de “Rainha das Flores”, mas “felizmente” esteve “pouco tempo afastado e pouco tempo doente”, avalia, com a satisfação disfarçada no sorriso maroto que o carateriza. E, “desde que me levantei e fui operado, apenas me proibiram de nadar. Mas até isso já fiz. E está tudo bem comigo”, acrescenta.
A cicatriz que lhe marca a intervenção na cabeça também vai desaparecendo e João garante que está “quase igual”. Sim, porque mudou um bocadinho e até ficou “mais piegas”: “Choro mais facilmente. Ainda recentemente estava a ver um filme de desenhos animados com o meu filho e comecei a chorar. Para além disso, deixei de comer carne e peixe. Deixei de gostar. Comi uma bifana recentemente e até isso me soube mal. Estou quase vegetariano. Agora como é sopa algo que dantes não gostava nada”.
Sem nunca perder a boa disposição, lembra ainda a reação do filho quando soube do que se passava através de terceiros. “Foi um choque para o Rodrigo porque nós estamos sempre muito presentes na vida um do outro. Nunca disseram ao meu filho o que é que o pai tinha e o Rodrigo veio a saber na escola – na crueldade das crianças – que o pai tinha um cancro e que podia morrer. Automaticamente, tornou-se educador do pai – ‘não podes comer isto e não podes fazer aquilo’. Foi difícil olhar para os olhos dele e hoje lembro-me disso ainda comovido. Tem-me a mim como a pessoa que brinca com ele e sentiu, se calhar, que ia ficar sem pai”, conta, como quem narra uma história.
No ecrã, em breve, será Mário Pereira, um antigo pescador com duas filhas adolescentes “com quem não mantém uma relação tão próxima quanto gostaria”. “Ele é despedido e para o calarem arranjam-lhe um café e depois a mulher também se despede dele para ir trabalhar para a empresa que o mandou embora. É um homem que vive ali no fio da navalha e no fio da vida… É a força de um homem perante tudo e perante todos para vencer”, resume, sem tirar beleza ao tão desejado suspense.
Com a personagem, João Ricardo partilha a vontade de “vencer acima de tudo”: “Eu sou católico, não acredito em Deus, acredito em Cristo e tenho esta certeza absoluta: eu nunca vou morrer! E já disse ao meu filho que o pai não morre. Deus queira que isso não dê para o torto”.
Ainda não totalmente curado, mas com muita energia, não quer ser poupado e, por isso pediu “para ter um papel muito ativo”. “Quero gravar como os outros. É bom sinal se assim for, quer dizer que está tudo bem. Só pedi uma coisa: para me darem tempo para nadar e para estar com o meu filho”, conclui com grande vontade de viver.
Fotos: Move Noticias