Atualidade

Por umas férias diferentes

Por Dantas Rodrigues, sócio-partner da Dantas Rodrigues & Associados

Chega o verão e, para muitas crianças e adolescentes, começa a época da angústia e da exclusão com o encerramento da escola. As crianças e os adolescentes de famílias de parcos recursos económicos, terminado o ano letivo, ficam privados do serviço gratuito de alimentação e de entretenimento, não têm para onde ir, os pais não dispõem de meios para lhes proporcionar uma mesa equilibrada e, muito menos, para lhes oferecer atividades extraescolares, os chamados ATL (Atividades de Tempos Livres), próprios para as suas idades, durante as férias de verão.

As razões são várias, mas as mais visíveis prendem-se indiscutivelmente com as políticas de austeridade iniciadas em 2010, por via das quais se fizeram cortes sucessivos nos apoios sociais, acabando por transformar as famílias mais vulneráveis em pobres, querenciando-as e desprotegendo-as cada vez mais, muitas vezes chegando mesmo ao ponto de lhes roubar toda a dignidade, chamando-se a isso pobreza envergonhada.

Em boa verdade, a exclusão da criança ou do adolescente do entretenimento a que a própria idade lhes dá direito também não é só por culpa das políticas de austeridade. Com efeito, a principal causa dessa exclusão, sobretudo ao nível das famílias separadas, muitas vezes reside na tutela parental. Senão vejamos: o regime habitual da guarda conjunta com as responsabilidades parentais exercidas em comum por ambos os progenitores, mas com a entrega do menor à mãe para com ela residir. O convívio com o pai passa a quinzenal e meramente com a possibilidade de com ele permanecer e pernoitar por umas escassas 48 horas. Este regime serve simplesmente para afastar o menor do pai, dos avós, dos tios e dos primos paternos, não cria afetos, mas unicamente imagens negativas em relação àquele que é naturalmente o seu progenitor e a família deste. E essa falta de convívio, em meu entender, afasta desde logo o menor de poder ir de férias com a família paterna, como se ela fosse constituída por «gente pouco recomendável».

Não compreendo a dificuldade que têm os juízes de família em estipular que as férias escolares sejam sempre repartidas entre as mães e os pais, ou mesmo passadas apenas com aqueles que ao longo de dez meses se viram privados de conviver com os filhos. Numa situação em que a mãe desfruta de poder residir com o filho, ao pai é-lhe unicamente destinado o papel de pagador de pensão de alimentos e de visitante, com dia e hora marcados. Com o andar do tempo, o filho não tardará em verificar que existe desequilíbrio e injustiça na relação entre os seus pais e, quanto mais sentir a alienação parental a que estiver sujeito, mais facilmente aprenderá a mentir, a exprimir emoções falsas e a manipular pessoas.

Assim, e para evitar situações dessas, o convívio com a família paterna não pode nem deve depender da vontade materna, pois, quando tal se verifica, a mãe outra coisa não pretende que dispor do verdadeiro poder paternal de «mandar», assumindo, por conseguinte, a dupla função de mãe/pai. E, para atingir os seus fins, por vezes até se coloca numa situação de vítima, não raro provocando conflitos com o pai, na presença do filho, para que este veja «que género de pai realmente tem».

O contínuo conflito com os pais é sempre extensivo à família destes. As mães muitas vezes preferem que os filhos fiquem sozinhos no verão, em casa, enquanto elas vão trabalhar, do que autorizá-los a partir de férias com os primos, com os tios ou com os avós paternos.

Quando pais e mães impedem o convívio dos filhos com a família paterna ou materna é porque se trata de retaliação motivada pela degradação da convivência entre ambos, degradação essa, cujas consequências acabam invariavelmente por atingir as pessoas que se encontram mais próximas na hierarquia familiar.

Em relação aos netos, os avós costumam, por tradição, desempenhar um papel complementar ao dos pais, embora de natureza diferente. De facto, ao contrário dos pais, a quem cabe, naturalmente, as funções do exercício da disciplina e da autoridade, os avós, esses, têm por norma um papel exclusivamente afetivo ou lúdico, tão salutar para a admiração e para o culto do respeito que deve existir entre gerações.

A dificuldade crónica da justiça em alargar o exercício das relações parentais à família do menor só mudará com a consagração legislativa da «regra da partilha das férias escolares» e quando os pais se puserem de acordo em sentido divergente. O juiz de família tem de ouvir os avós ou outros familiares com especial referência afetiva para a criança sobre a possibilidade de usufruir do seu convívio num período determinado.

Corresponsabilizar a família e inserir nela o menor é o caminho a seguir para se alcançar bons resultados no que toca a educação extraescolar, além de promover a conciliação laboral dos pais no momento em que eles não podem estar junto dos filhos. Esta medida sem dúvida que viabilizará da melhor maneira a convivência entre pais, filhos e restante família, e conferirá mais equilíbrio ao exercício do poder familiar, desencorajando desse modo qualquer tentativa alienadora por parte de um dos progenitores. Orientada pelos princípios constitucionais da igualdade e da solidariedade, e sempre no melhor interesse da criança ou do adolescente, a corresponsabilização da família a que mais acima aludi poderá então acabar com a angústia das férias problemáticas e transformá-las em saudável alegria. Numa simples palavra: férias diferentes.