O ator Lima Duarte – que completou no dia 29 de março 90 anos de vida, sozinho, em plena pandemia – fez um comovente desabafo para homenagear o amigo e colega de profissão Flávio Migliaccio, de 85 anos, que foi encontrado morto na sua quinta, segunda-feira (4).
No vídeo, o reconhecido ator brasileiro fala sobre a morte do colega, que cometeu suicídio e deixou uma carta à família em onde diz que a humanidade “não deu certo”.
“Eu te entendo, Migliaccio”, afirmou Lima Duarte. “Agora, quando sentimos o hálito putrefato de 64, o bafio terrível de 68. Agora, 56 anos depois – eu tenho 90, você com 85 -, quando eles promovem a devastação dos velhos, não podemos mais”, referiu numa referência aos recentes e constantes atos de defesa da ditadura militar e de minimização dos riscos da pandemia de coronavírus praticados por bolsonaristas.
“Eu não tive a coragem que você teve“, sublinhou o ator, valorizando a atitude do amigo ao querer acabar com a vida.
“Os que lavam as mãos, o fazem numa bacia de sangue“, finalizou, com palavras oportunas tiradas que interpretou. Veja a mensagem:
Num texto publicado no Facebook, o filho do falecido ator, o jornalista Marcelo Migliaccio, escreveu: “Meu pai fez o que fez à nossa revelia. Pegou um táxi e foi para o sítio enquanto eu cuidava da minha mãe no último domingo. Sem nos avisar, sem se despedir. Ele sempre me dizia que não aguentava mais viver num mundo como esse e sentir seu corpo deteriorar-se rápida e irreversivelmente pela idade avançada. Pouco escutava e enxergava. “Daqui para frente só vai piorar”, ele me dizia enquanto eu buscava todos os argumentos possíveis para lhe mostrar que ainda havia muita coisa boa reservada para ele. Como o prêmio de melhor ator de televisão de 2019, que incrivelmente ele ganhou aos 84 anos de idade. Ou como ver no cinema o documentário sobre sua vida e sua carreira que estamos preparando para breve.
Mas meu pai tinha uma inteligência enorme e era difícil demovê-lo de alguma coisa em que acreditasse. Infelizmente, ele agora é para nós só uma imensa saudade e lembranças maravilhosas. Lembranças de alguém que me ensinou o que é amar um ofício. Alguém que me mostrou a magia da criatividade. Me fez ver que a maior prova de amor que se pode dar a uma pessoa é respeitar suas convicções, suas decisões, seu jeito de ser e de não ser.
Por isso hoje respeito o ato de extrema coragem que meu pai teve na madrugada de ontem, fazendo o que acreditava ser a única coisa a fazer. Tentei impedir de todas as formas, sofro agora, e sofrerei para sempre, por não ter conseguido, mas entendo sua decisão.
Agradeço de coração a todos que me enviaram mensagens. Fizeram um bem enorme a mim e a ele, onde quer que ele esteja nos esperando“.