De chorar por mais

A Adega do Ribatejo e os Vinhos de Vale de Fornos

Regressei em noite recente e luminosa ao chamamento acolhedor da casa de pasto Adega do Ribatejo.

A convocatória era irrecusável porque feita por um amigo maior, o Engº Miguel Monteiro, que hoje segue o valioso legado da mãe à frente da magnífica Quinta de Vale de Fornos.

O pretexto era o da apresentação dos vinhos de Vale de Fornos depois de uma aposta madura e responsável na viticultura e na enologia iniciada há alguns anos. Com resultados sólidos, diria exuberantes, acompanham a boa forma e relevância dos vinhos do Oeste que se vêm afirmando, paulatinamente, como uma das mais dinâmicas regiões vitivinícolas de Portugal.

A “casa” de Vale de Fornos no Porto tinha que ser a Casa de Pasto do Ribatejo. Por questões de pronúncia ou de cultura? Talvez não… porque, a verdade, é que o Miguel Monteiro apesar de apaixonado ribatejano é um adoptado e conjurado do Porto de há muitos e bons anos. Assim também o nosso amigo Vítor, um portuense de gema que há 12 anos lidera com jovialidade esta boa casa de comer, com ADN ribatejano.

Muitos amigos e um magnífico ambiente nesta adega bonita que começa com o tradicional balcão e se alarga generosa para uma sala familiar e elegante. Para os dias primaveris que se avizinham, o Vítor prepara com carinho o espaço exterior, uma magnífica latada a prometer petiscos novos pela tarde fora.

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Voltemos ao jantar. O rosé da casa – fresco, com a acidez certa, guloso de frutos vermelhos e persistente na boca, é um vinho de entrada e de aperitivo de excelente perfil. Foi servido com umas calorosas espetadas de rojões de porco preto que ali se harmonizaram com alegria.

Depois veio uma deliciosa sopa de peixe: – bem-feita com uma emulsão onde bem casavam as gorduras sápidas e ternas do mar.

De seguida viria um delicioso sável frito, muito fino, com uma açorda de ovas e ovo escalfado a colorir. Numa primeira versão mais densa e, depois, numa segunda versão – diga-se mais ribatejana, onde a açorda é mais fina e se espraia pelo prato, não deixando que o pão prejudique a delicadeza das ovas.

O prato foi acompanhado de um branco gordo na boca, mas fresco e jovial, com uma acidez equilibrada e suficiente.

Passamos depois aos pecados da carne. E eles vieram insinuantes, na forma de um lombinho de salpicão de porco preto, macios e rescendentes a encher-nos a boca de truculentos sabores.

O tinto de entrada com Cavernet Sauvignon e Castelão portou-se muito bem, com taninos fortes, marcados, com os frutos vermelhos muito intensos e um prolongamento na boca apreciável.

Mas estavam ainda guardadas duas grandes estrelas da “companhia”. Uma quase Michelin porque era da casa do Miguel Monteiro – o famoso Grande reserva de Sirah – vinho muito impressivo, a soltar aromas mais complexos que se harmonizam com muita elegância, num paladar persistente e seguro, bem casado com a madeira onde estagiou. É de facto um dos grandes representantes do melhor que se faz nesta região.

A outra estrela era a dos miminhos da Senhora do Senhor Vítor – uma fada de carne e osso que faz uma sobremesa de se lhe tirar o chapéu – com uma massa fina e estaladiça que se deixava envolver em ovos moles e em miolo de noz. Qualquer coisa de divinal que nos deixou a boca em agradecido alvoroço e a memória a obrigar-nos a repetir muitas vezes.

Claro que a Casa de Pasto Adega do Ribatejo tem muitas mais propostas degustativas, mas essas ficam para o desafio que faço de a ir visitar com toda a confiança.

Já a mítica Casa de Vale de Fornos, casa senhorial mandada construir pela não menos famosa D. Antónia Ferreira para o casamento de sua filha com o 3º Conde da Azambuja, foi uma vez mais dignificada por um conjunto de vinhos que homenageiam com emoção a verdadeira grande senhora desta Casa, construtora da Vinha, dos Vinhos e do belíssimo Enoturismo que aqui se pratica que foi a Senhora D. Graciete Monteiro, por quem devoto dedicada admiração.

Uma vénia saudosa em sua memória na convicção que eu tenho de que o sonho que ela teve continuará viçoso e sublime como os vinhos que provamos nesta noite memorável.

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