Off the record

Iker Casillas: A manter o equilíbrio na rede

A linguagem do futebol é muito vasta e rica. A cada passo presenteia-nos com grandes pérolas, verdadeiras lições que podemos transportar para qualquer vertente da nossa vida. Quem nunca quis, por exemplo, superar uma situação de pressão quotidiana movido por um grito de confiança? E, nesse sentido, haverá algo mais libertador do que um “anda bater, tu bates bem. Se perdermos que se fo**!”?

“Bater”, bater na gíria do ‘futebolês’ também tem vários sentidos. Cristiano Ronaldo usou aquela palavra para indicar a João Moutinho que estava capacitado a marcar um penálti decisivo no Euro’2016. Noutra perspetiva, diz-se dos guarda-redes que, das duas, uma, ou ‘não batem bem da tola’, são loucos, ou então são panel*****.

É no equilíbrio desta última doutrina do futebol, na qualidade de exceção que confirma a regra, que encontrámos o protagonista desta linhas. Falamos de Iker Casillas Fernández ou San Iker, uma das maiores lendas vivas das balizas do futebol mundial.

Note-se que o primeiro parágrafo em que escrevemos o nome de Casillas foi também o primeiro no qual não saiu qualquer impropério mascarado por asteriscos. Não foi por acaso. A classe do internacional espanhol, de 35 anos, assim o exige. Ainda que viva no mundo do futebol e o conheça por dentro como poucos, Iker situa a sua forma de estar nele numa linha ímpar, raras vezes vista no meio envolvente.

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Dentro e fora dos relvados de jogo, pauta-se por uma noção de equilíbrio fantástica, uma postura que lhe permite fazer trapézio nas cordas mais altas do futebol, sempre com imunidade ao medo de cair, pois sabe que haverá lá sempre várias redes prontas a ampará-lo, em jeito de retribuição pela quantidade de bolas que impediu que nelas batessem, ao longo da sua carreira.

As redes do amparo de Iker Casillas acabam, neste contexto específico, por ser metáforas relacionadas com a família que formou ao longo da sua carreira e que o ajudou a catapultar-se para o sucesso no plano desportivo/profissional. Sara Carbonero é a cara metade do guarda-redes desde há muitos anos. Martín foi o primeiro fruto desse amor, Lucas veio logo a seguir, sendo que já nasceu com Casillas a representar o segundo clube da sua carreira, o FC Porto.

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O espanhol, está visto, não é homem de muitas paixões. Rodeou-se de “poucas mas boas” e sabe que é tudo o que lhe basta para ser feliz quando decidir pousar as luvas e pendurar as chuteiras. Contudo, isso ainda não é para já e, até a reforma dos relvados chegar, sabe que na bancada, sobretudo na do Estádio do Dragão, terá sempre a mulher que lhe conquistou o coração.

Aliás, esse apoio sempre esteve lá. Mesmo quando representava o Real Madrid, onde conquistou todos os títulos possíveis e imaginários, ou a seleção espanhola, por quem chegou também ao topo da Europa e do mundo. Quando o país vizinho logrou vencer o Mundial’2010, na África do Sul, foi Sara Carbonero quem entrevistou Iker no final da partida decisiva. Aí, num raro momento de loucura, o guarda-redes emocionou-se e beijou-a em direto, num gesto que emocionou o planeta.

Foi de facto um momento raro de extroversão sentimental na vida do guarda-redes. A prova disso está no facto de até o seu próprio casamento ter decorrido em segredo, longe do foco mediático que sempre tenta desviar da sua vida particular.

Fez precisamente um ano, nesta segunda-feira (20), que Iker e Sara se casaram. Desde então, como que Casillas renasceu para o futebol e começou a bater diversos recordes. Ele já é, por exemplo, o jogador com mais jogos disputados em partidas sob a égide da UEFA. Além disso, nunca como nesta temporada, ao serviço do FC Porto, esteve tantos jogos sem sofrer qualquer golo.

Esta é a prova de que, seguramente, prosseguirá pelo menos mais um ano com o emblema do dragão ao peito. Tudo está apalavrado nesse sentido e, a confirmar-se, poderá continuar a injetar todo o equilíbrio e experiência, que ganhou ao longo dos anos, num grupo de trabalho marcado pela juventude.

Segue-se uma prova de fogo no Estádio da Luz, contra o Benfica, clássico no qual se costuma superar. Em fase adiantada da sua carreira, Iker já não treme perante esse tipo de partidas e a sua influência poderá ser determinante para ajudar a equipa de Nuno Espírito Santo a superar os encarnados e a subir à primeira posição do campeonato. Só assim o espanhol poderá juntar mais um título, o primeiro como jogador do FC Porto, ao seu vasto currículo.

Casillas

E, também aí, sabe que se falhar não faltará quem o apoie. É que além da família e dos amigos, Iker também conquistou uma legião de faz, não só pelos títulos que conquistou ao longo da carreira, mas também pela proximidade que mantém com os seus seguidores na outra rede em que é assíduo, a social.

A postura de Casillas vem assim desmistificar aquilo que se diz dos guarda-redes. A elegância e o equilíbrio que patenteia comprova que, também na linguagem do futebol, há sempre aquela exceção que confirma a regra. Por isso, ninguém duvida que, caso tivesse nascido em Inglaterra, Iker já teria o título de ‘Sir’. A verdade é que nasceu em Espanha, mas a alcunha de Santo (San) também lhe encaixa como uma… luva.

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